A chegada dos novos meios eletrônicos de pagamentos levou à redução do uso de cheques, mas os talonários ainda estão nas ruas. A tradicional folha continua sendo uma opção de pagamento e também um instrumento de crédito.
“O uso de cheque caiu, mas ainda é utilizado principalmente nas pequenas empresas que aceitam o pagamento pré-datado”, diz Fábio Ieger, CEO da fintech Certus. Ele lembra que é comum o cheque mudar de mão: quem deposita não é quem o recebeu.
O gerente de meios de pagamento da Sicredi Vale do Piquiri Abcd PR/SP, Mauricio Guerra, cita alguns dos motivos que tornam o pagamento em cheque mais atrativo para os empreendedores: não tem o custo operacional cobrado pelo uso das máquinas de cartão e pode ser repassado para frente para o pagamento de fornecedores, por exemplo.
“O meu professor de artes marciais só aceita o pagamento em cheque. Dou 12 folhas para ele, que diz que consegue fazer a troca e isso facilita a sua operação”, diz Guerra.
O cheque acaba sendo usado como uma moeda corrente. Já o cartão implica taxas cobradas pelas empresas que fazem parte da cadeia de pagamentos, o que é um impeditivo para muitos pequenos empresários, além de ter limites de valores e prazos.
“É muito difícil conseguir parcelar em mais do que 12 vezes no cartão de crédito. E quando as compras envolvem altos valores, o cheque aparece como uma alternativa”, destaca Ricardo Rocha, professor de Finanças do Insper. Ele afirma que não é incomum pequenos comerciantes incentivarem o uso do cheque também para pagamento de pequenos valores. Chegam até a dar alguns dias para quem paga com a folha.
“Na capital paulista, há muitos bares e restaurantes que só aceitam o pagamento em dinheiro ou cheque”, diz, lembrando que o relacionamento com o lojista costuma ser primordial nessas transações.
O risco de receber cheque sem fundos é a principal preocupação de quem recebe esse meio de pagamento. Por isso, as folhas normalmente são aceitas de clientes que já têm relacionamento com o estabelecimento, o que reduz perdas.
Os bancos oferecem custódia para os cheques e, em alguns casos, até a antecipação de recebíveis, da mesma forma que os cartões de crédito.
O professor do Insper comenta que nem todas as pessoas têm familiaridade com os meios eletrônicos e, por isso, o cheque acaba sendo uma solução mais fácil e acessível para esses consumidores.
Não é o caso do médico neurocirurgião Wanderley Cerqueira, 65, que usa tecnologia de ponta para realizar os procedimentos médicos e já fez pagamento pelo Pix (meio de pagamento eletrônico lançado pelo BC no ano passado). “Mas sinto mais segurança com o pagamento em cheque em algumas situações”, conta.
Ele prefere usar as folhas porque considera o controle das operações mais fácil e seguro em relação aos pagamentos eletrônicos.
“Guardo o canhoto e assim consigo ter um controle melhor dos pagamentos realizados”. O médico usa o cheque principalmente para pagar prestadores de serviço e funcionários.
“É um comprovante de pagamento. Se eu pagar com dinheiro, por exemplo, mesmo com recibos, há possibilidade de ter questionamentos. Com o cheque, se houver qualquer dúvida, peço a microfilmagem e consigo comprovar que o pagamento foi realizado.”
Mas apesar de ainda ter o seu espaço no mercado, o uso de cheques tem sido cada vez menos significativo nas operações de pagamentos.
Apenas 7% dos consumidores costumam usar cheques, boletos ou crediários atualmente para pagar suas contas, segundo a última pesquisa “Brasileiro e sua Relação com o Dinheiro”, promovida pelo Banco Central. A pesquisa inclui essas modalidades na categoria “outros meios”.
Levantamento do Banco Central mostra que em 2019, último ano com dados disponíveis, foram realizadas cerca de 550 milhões de transações bancárias envolvendo cheques no país. Um ano antes, haviam sido 633 milhões de operações.
Ainda de acordo com dados levantados pelo Banco Central, foram movimentados R$ 1.52 bilhão em cheques em 2019, contra R$ 1,67 bilhão no ano anterior.
Em 2010, as transações com cheque somaram R$ 2,6 bilhões. no ano passado este número caiu para R$ 1,5 bilhão.
Segundo a Febraban (Federação Brasileira de Bancos), o valor médio dos cheques emitidos ano passado era de R$ 2.327. Em 2010, o tíquete médio ficou em R$ 919.
Com exceção de bancos com operação 100% digital, as instituições ainda disponibilizam cheques, mesmo que seus clientes não usem essa opção.
É preciso emitir as folhas em caixas eletrônicos com essa função e há um limite de unidades que podem ser impressas por vez, dependendo da instituição financeira.
https://www1.folha.uol.com.br/mercado/2021/01/cheques-persistem-como-opcao-para-pagamentos-no-brasil.shtml?origin=folha